2012
será lembrado como um dos anos em que o mundo não acabou -- para desgosto dos
que, desencantados com a espécie humana, suspiravam por uma hecatombe. Embora
esse tipo de prognóstico seja absurdo, o alarme sobre o fim dos tempos ainda
impressiona muita gente. Basta ver quantos se prepararam para o desastre.
Os
espertos, como sempre, se aproveitaram da ingenuidade dos crédulos para vender
abrigos inexpugnáveis onde seria possível resistir à derrocada do planeta. Uma
das cláusulas do contrato assinado entre as partes devia estipular que, no caso
de não ocorrer nenhuma tragédia, o dinheiro não seria devolvido. O mercado não
pode, afinal de contas, pagar pelos erros dos profetas. Felizmente o mundo não
acabou, e muitos dos que acreditaram nessa ficção estão hoje às voltas com uma
dívida imobiliária (ou seja, com mais razões para desejar que venha mesmo o fim).
O imaginário do fim dos tempos
remonta a muito antes de Cristo e se alimenta da falta de perspectiva e
esperança -- não apenas no aspecto material, como também no moral. É a miséria
e a falta de sentido que engendram os anseios escatológicos. A perspectiva de
todos morrerem seria uma forma de compensar as desigualdades, nivelando ricos e
pobres. Para quem não vê horizonte neste mundo, a saída é imaginar a redenção
no outro -- ou em lugar nenhum.
O
maior problema desses delírios sobre o fim do mundo é que nem sempre eles ficam
no plano da fantasia. Muitos dos que os cultivam se dispõem mesmo a apressar o
desfecho, promovendo desastres que exterminem o máximo de pessoas possível. Foi
o caso do adolescente que matou 26 pessoas em Newtown. A mãe dele comentava com
os amigos que a sociedade onde viviam estava à beira de um colapso
socioeconômico; construiu um arsenal em casa e ensinou o filho a atirar para se
prevenir de uma tragédia iminente. A ironia está em que a ação preventiva acabou
desencadeando a chacina da qual ela foi a primeira vítima.
A
verdade é que o mundo (ou melhor, o universo) nunca se acabou. Pelo contrário,
ainda está em expansão. Não dá para imaginar o instante em que o seu
desenvolvimento chegará ao limite, quando tudo terminará ou entrará num novo
recomeço. Para estar aqui hoje resistimos a inúmeras convulsões marinhas e
terrestres, algumas produzidas por corpos celestiais que atravessaram o espaço
e se chocaram com o nosso planeta. Segundo os astrônomos, a possibilidade de
sofrermos esse tipo de acidente é cada vez mais remota, o que também torna
distante a possibilidade do fim do mundo.
Nem por isso nos sentimos mais seguros. O que
verdadeiramente nos ameaça acontece aqui na Terra. Não provém de corpos intergalácticos,
mas da natureza humana. O egoísmo, a maldade, a indiferença com os outros são
os verdadeiros agentes do cataclismo. A fantasia do fim dos tempos é uma utopia
às avessas, cultivada por indivíduos que não veem saída para este mundo confuso
e injusto; emerge como uma panaceia na mente de alguns perturbados. Ao
facilitar o acesso a armas de fogo, algumas de enorme potencial destrutivo, a
sociedade acaba lhes fornecendo os meios de executar sua vingança.
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