Nestor
tinha pavor de ser traído. Casado há dois anos com Verinha, sofria pesadelos
imaginando-a com outro. Como esse medo se tornava uma obsessão, ele sentiu que
precisava desabafar com alguém para não enlouquecer. Pensou em Eduardo, seu melhor
amigo. E um dia, entre uma cerveja e outra, falou-lhe da sua angústia.
O
amigo, para surpresa de Nestor, não lhe tirava a razão:
--
Longe de mim duvidar da honestidade de Verinha, mas hoje os tempos são outros.
Li recentemente que as mulheres estão traindo tanto quanto os homens.
--
Você leu? Onde? -- quis saber Nestor, aflito, passando sem querer a mão na
testa.
--
Ah, li em vários lugares... E tenho uma tese sobre isso: as mulheres traem
justamente os pudicos, os certinhos.
--
Os certinhos... como eu? Explique melhor.
Eduardo
emborcou metade do copo de cerveja e prosseguiu:
--
Para mim, mulher só é fiel quando tem medo de ser traída. A fidelidade nela não
é uma virtude, mas uma estratégia de defesa. A mulher só ignora os outros
homens quando convive, concretamente, com a possibilidade de perder o seu.
--
Mas isso é um absurdo! Ou você está doido, ou leu muito Nelson Rodrigues.
--
Vá por mim, Nestor. Quer que Verinha seja fiel a você? Dê a entender a ela que
tem outra -- ou melhor: tenha mesmo outra! Ela vai ficar tão concentrada nisso,
que não enxergará no mundo outro homem além de você.
A
conversa não saiu da cabeça de Nestor, que terminou vendo algum sentido nas
palavras de Eduardo. Precisava
“preocupar” Verinha para que ela não tivesse tempo nem ânimo de pensar em
outro. Uma semana depois começou a namorar Alzira, caixa de uma lanchonete que,
havia já algum tempo, enrubescia quando lhe passava o troco. Como trabalhavam
de dia, marcaram para se ver de noite pelo menos uma vez na semana.
Verinha,
claro, começou a desconfiar. O que podiam significar aquelas fugas noturnas
senão outra mulher? Sofreu em silêncio até que não aguentou mais e resolveu se
abrir com alguém. E ninguém mais adequado para confidente do que Eduardo, o
melhor amigo do marido. Ele devia saber de alguma coisa.
E
sabia mesmo. Eduardo lhe propôs um encontro numa lanchonete (a mesma, por
sinal, onde Alzira trabalhava) para conversarem sobre “o caso” de Nestor.
--
Ele tem um caso? -- foi a primeira pergunta que Verinha fez antes de pedirem um
sanduíche com suco de laranja.
--
Infelizmente, sim. Você não merecia... ou melhor: merecia.
--
Eu merecia? Por quê?
--
Verinha, você não conhece a psicologia masculina. A fidelidade no homem não é
uma virtude, mas uma estratégia de defesa. O homem só ignora as outras mulheres
quando convive, concretamente, com a possibilidade de perder a sua. Por que não
lhe dá uma lição?
--
Lição?
--
Claro. Arranje alguém. Quando Nestor desconfiar de que você tem outro, vai
ficar desesperado e se tornar de novo um marido fiel.
Verinha ficou impressionada com a conversa. Dias
depois, telefonou para Eduardo a fim de aprofundarem o assunto. E não só para
isto. Se tinha mesmo que trair Nestor, que fosse com alguém que lhe dissera
palavras tão profundas.
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